"
O repto, bem ao jeito Americanizado, foi lançado ao grupo dos “fraquinhos” bem cedo. Talvez impulsionado pelos belíssimos dias Primaveris que a passagem de Estação nos proporcionou, o “Comandante” pulverizou este cantinho de histórias e notícias, de escárnio e também mal dizer com o “Challenge for Holy Friday, April 22”, à distância de um mês!!!
Logo se replicaram os comentários e observações de puro regozijo, por abandonar-mos, por um dia que fosse, os já mais que trilhados Caminhos de S. Tiago, Caminhos da Costa, S. Gonçalo, Franqueira, Casa Velha, Monte do Xisto, Antenas (sabem-se lá quais?), Vacaria, Montaria ou Sra. do Minho, Natário…
As provocações sadias também não deixaram de soar, neste espaço por todos partilhado e por muitos outros bisbilhotado. Houve mesmo, pasme-se só, quem disputasse a liderança da liga dos últimos ou quisesse ficar rotulado de “Sebastião come tudo” tal foi a abundância de sugestões muito pouco gourmet…
Apimentado por uns, o desafio incutiu em outros, mesmo com o calendário a coincidir com o já tradicional e prolongado fim-de-semana de celebrações religiosas de Páscoa, o desejo de prolongar a estadia por terras do Gerês, finalizado que fosse o passeio com recurso ás malaguetas, aos binómios carbo-alu, aos cães rafeiros ou às duplas forquetas.
Havia que reunir famílias à volta de uma mesa por forma a confraternizar em espírito de quadra festiva - embora considere que serviriam mais de “choferes” para que o regresso não agravasse a sinuosidade do próprio traçado das estradas…
Porém, fruto da grave e profunda crise económico-financeira que assola a Europa e especialmente Portugal, não foi possível obter estadias em qualquer unidade hoteleira da região por se encontrarem com taxas de ocupação elevadas… mais uma vez, Portugal no seu melhor!!! Tenho orgulho em ser Tuga, ou não. O último a sair que feche a porta…
Se há margem de muitos dias a iniciativa prometia, maior se tornou o “Challenge” com o constatar que as previsões climatéricas não seriam de todo favoráveis, uma vez que se adivinhavam dias prévios de muitos aguaceiros, e alguma pluviosidade para o próprio dia, o que, muito provavelmente, agravariam por si só as dificuldades aguardadas.
Mas os “fraquinhos” acordaram cedo, ou nem se deitaram, e as incitações continuaram a não olhar a meios e fins, 05H55 da madrugada…
…arvoraram-se de armas e bagagens, e muitos quilos de barras de cereais, muniram-se de líquidos de fruta nutritivos (sumo de uva?)… e “pílulas do dia seguinte”...
… e foram fazer trabalho comunitário em prol de uma população carenciada do interior… NÃO!!! Foram passear de bicicleta!?!? Se fosse para trabalhar ninguém aparecia, mesmo que remunerado!!!
Confirmadas as previsões de chuva miúda mas constante (as indumentárias falam por si só), ingerido que foi o primeiro estimulante (apenas café que a malta é quase toda da Póvoa) e “flashada” a primeira foto de grupo do dia, foi dado o tiro de partida para aquilo que seriam cerca de 9 horas (mais do que um período normal diário de trabalho) sobre rodas, sobre calçado ou sob densa vegetação… pelo menos para alguns dos dezassete menos um (17 - 1)! E o chinês não veio…
Literalmente, em ritmo de passeio, até porque os primeiros kms denotaram aquilo que nos esperava, altimetria quanto baste e percursos tão belos como “colantes” o grupo enveredou Gerês dentro! E os confrontos com a natureza foram sucedendo-se, não temendo sequer a posição hierárquica deste clube elitista…
A caminho da primeira grande dificuldade do dia das três previstas (que mais tarde se revelariam serem quatro!) surgiu a única avaria técnica de todo o evento digna de registo: quebra de um “dropout” de uma das “Lapierre’s” presentes, fraquinhas…
Vencida que foi a subida íngreme a Sta. Eufémia, se a memória não me atraiçoa a mais de 1 000m de altitude, houve também lugar a bom e prolongado momento de descontracção.
Este último, propiciado por uma longa descida onde os menos incautos nos deliciaram com algumas pequenas quedas dignas de figurarem nas hilariantes compilações vídeo de paródia…
Decorridos que estavam cerca de 32 Kms havia que forrar o estômago com algo mais que alimentos de absorção rápida e altamente calóricos que deram lugar a sanduíches de queijo, de marmelada e de uma espécie de carne grelhada (leia-se esturricada) secundadas por bebidas quentes, ou não… por forma a encarar a dita Serra Amarela cujo ponto mais perto do S. Pedro marcava pouco mais de 1 350m ou pouco menos de 1 500m, dependendo da leitura.
Registada a façanha de todos os que perfilaram no início do dia e finda que estava a segunda grande dificuldade, depois de algumas cócegas à planta dos pés do Santo, este anuiu a oferecer-nos um resto de dia com temperatura muito agradável (a rondar os 18ºC) e já sem chuva, com o sol a espreitar sempre que ultrapassadas as nuvens baixas que ladeavam a descida que antes havíamos escalado - qualquer coisa como 14kms!!!
Sem qualquer contratempo e novamente a velocidades sempre bem medidas, a descida permitiu alongar o grupo para que todos desfrutassem a seu belo prazer, e retemperassem forças para aquilo que à partida seria o último (terceiro) obstáculo a transpor.
A Serra Amarela - a inclinação da aldeia de Brufe (para os gastronómicos, o ponto de referência / interesse é o restaurante O Abocanhado).
Mas, bem ao jeito do nosso “Comandante”, se o desígnio inicial seria, entre outros, alternar pelos trilhos mais que explorados das zonas limítrofes da Póvoa, embora se reconheça que foi cumprido, também o foi no que concerne ao modelo com que quase sempre nos presenteia nas saídas de fim-de-semana… exploração ao gosto de Sir David Attenborough. Assim, por cerca de 3 kms, a descida teve como cenário uma densa vegetação, um sinuoso traçado coadjuvado com um declive igualmente íngreme onde em grande parte do mesmo era quase impossível arrastar bicicleta e condutor paralelamente, quanto mais descer com segurança sobre a primeira.
Em Março de 2010, na aventura “A Lenda da Arga”, um sujeito escreveu… “Na descida de Arga até à Montaria, mais parecia que levávamos a companhia da figura de BD "O Muttley", pois ouvíamos o nosso companheiro (…) a rezingar desde as eólicas até ao final da trialeira, durante cerca de 6 km…”
Desta feita, nem imaginam a quantidade de vezes que outros ecoaram serra abaixo as famigeradas frases que me abstenho de reproduzir integralmente, pelo menos a primeira, face à época religiosa que acabo de cumprir: “O Lino vai pró #$%/#”?$#!!!” ou “Falta o Carneiro!”, dadas as condições desumanas, que sem alternativa, fomos obrigados a levar a termo…
Depois da nossa passagem (17 – 1), face à quilometragem acumulada, ao esforço desprendido para ultrapassar as dificuldades esperadas e mais ainda as inesperadas, aliada aos berros e palavrões que agrediram as belas paisagens, tenho grandes dúvidas, ou mais certezas, que a fauna e flora daquelas serras voltarão a ser como antes. Porventura, estará mesmo em causa, tão ao jeito de especuladores que nos inundam as praças, a reclassificação do Parque Nacional da Peneda Gerês…
Mas a coisa fez-se. Arranhão a mais, gozo a menos, mais lamúrias e insubordinações comedidas e dirigidas ao “Comandante”, esta terceira dificuldade também foi superada por todos embora com um cenário que antevia um desfecho menos positivo… Os “fraquinhos” começaram a denotar fadiga, ou preguiça!
Porque estávamos em terreno selvagem os encontros com a natureza atenuaram a solidão de uma terra e povoação que ainda vive muito isolada, mas que torna ainda mais apetecível um possível regresso a breve trecho, desta feita com contrato firmado e selado com o S. Pedro!
Com os olhos já postos no último e derradeiro esforço do dia (quarto, pelo contratempo provocado pelo terceiro) e a mente consciencializada no retemperador banho que nos aguardava no parque de campismo iniciou-se a ascensão à Serra Amarela (aldeia de Brufe).
Fraccionado o grupo, os ritmos foram impostos, pelas reservas de energia que se haviam poupado e, desde muito cedo, se fazia uma leitura muito precisa da capacidade de sofrimento que alguns, porventura, teriam de dispender…
Os “fraquinhos” só queriam era por os “pés debaixo da mesa” e que a tormenta virasse logo bonança.
Para bem das almas e muito mais do corpo, um trauseunte, que havia acordado de madrugada para passear de bicicleta circulava, ocasionalmente, por ali ao volante de uma “furgoneta” e ao jeito de carro vassoura, recolheu todos os “fraquinhos” que nem pensaram duas vezes, muito antes de se atingir o ponto mais alto da subida.
Quanto à descida em direcção ao parque de campismo, foi feita a grande velocidade, facilitada pela ausência de contratempos e dificuldade de relevo, mas sempre circundada pela beleza de paisagens que teimam, e bem, em resistir à intervenção humana.
Ou seja, dos dezassete menos um (17 - 1), apenas oito cumpriram na íntegra todo o percurso! (17 – 1) – 8 = 8, e nenhum destes era o chinês!
Para perpetuar na memória de todos os “fraquinhos”, ficou mais um excelente dia na companhia de quem gosta de companhia…
Aos que não tiveram oportunidade de marcar presença, ficou a nítida vontade de repetir estes e outros trilhos nesta mesma região, talvez numa jornada dupla, assim o permitam todas as condicionantes.
NOTA: Consegue-se disponibilizar mais fotos, assim informem para que caixa de correio electrónico pretendem o envio. "
O Escritor